Este dialogo abaixo é reprodução de um capitulo do filme Sonhos de Akira Kurosawa, copiei do site
Eu-Lirico. Abaixo tem o link para o video deste trecho do filme no You Tube, testei o link mas pode ser excluído por ser propriedade da Warner Bros. O capitulo começa com a chegada de um viajante em uma pequena aldeia,
Viajante – Qual o nome deste povoado?
Ancião – Não tem. Só chamamos de “O Povoado”. Alguns chamam de Povoado do Moinho.
Viajante – Todos os habitantes moram aqui?
Ancião – Não. Moram em outros lugares.
Viajante – Não há eletricidade aqui?
Ancião – Não precisamos. As pessoas acostumam-se ao conforto. Acham que o conforto é melhor. Rejeitam o que é realmente bom.
Viajante – Mas, e as luzes?
Ancião – Temos velas e óleo de linhaça.
Viajante – Mas a noite é tão escura.
Ancião
– É. Assim é a noite. Por que a noite deveria ser clara como o dia? Eu
não ia querer noites claras, que não deixassem ver estrelas.
Viajante – O senhor tem arrozais. Mas não tem tratores para cultivá-los?
Ancião – Não precisamos. Temos vacas, temos cavalos.
Viajante – O que usa como combustível?
Ancião
– Lenha, na maioria das vezes. Não achamos direito cortar árvores, e
muitos galhos caem sozinhos. Cortamos e usamos como lenha. E para carvão
de madeira, poucas árvores aquecem tanto quanto uma floresta. Também
estrume de vaca dá bom combustível. Gostamos de viver respeitando a
natureza. As pessoas, hoje, esqueceram que são apenas parte da natureza.
Mas destroem a natureza da qual dependem nossas vidas. Elas sempre
acham que podem fazer melhor. Especialmente os cientistas. Podem ser
inteligentes, mas não compreendem o verdadeiro significado da natureza.
Só inventam coisas que tornam as pessoas infelizes. Mas têm tanto
orgulho das invenções deles. Pior é que muita gente também se orgulha.
Encaram-nas como milagres. Idolatram-nas. Não percebem, mas estão
perdendo a natureza. E, como conseqüência, vão morrer. As coisas mais
importantes para o ser humano são ar puro e água limpa, as árvores e
grama que os produzem. Tudo está sendo poluído, e perdido para sempre.
Ar sujo, água suja, sujando os corações dos homens.
Viajante – Vindo para cá, vi algumas crianças colocando flores em uma pedra ao lado da ponte. Por quê?
Ancião
– Ah, isso. Meu pai me contou uma vez. Há muito tempo, acharam um
viajante morto, perto da ponte. Os aldeões ficaram com pena e o
enterraram lá. Colocaram uma pedra na tumba dele e puseram flores.
Tornou-se um costume colocar flores lá. Não só as crianças. Todos os
aldeões colocam flores quando passam, embora a maioria não saiba por
quê.
Viajante – Há um festival hoje? (ouvindo uma festividade aproximando-se).
Ancião – Não, é um
funeral.
Acha estranho? Um funeral é sempre agradável. Viver bem, trabalhar bem e
morrer com agradecimentos é louvável. Não temos templos nem sacerdotes
aqui. Assim, os próprios aldeões levam os mortos até o cemitério da
colina.
Mas não gostamos quando jovens e crianças morrem. É difícil comemorar tal perda.
Mas, felizmente, as pessoas deste povoado levam uma vida natural.
Então, morrem de acordo com a idade. A anciã que vai ser enterrada viveu
gloriosamente os 99 anos. Agora, vou unir-me ao cortejo. Com licença.
Na verdade, ela foi o meu primeiro amor. Mas ela partiu meu coração e me
trocou por outro. Ha! Ha! Ha! Ha! Ha!
Viajante – A propósito, quantos anos tem?
Ancião
– Eu? Cem... mais três. Boa idade para parar de viver. Uns dizem que a
vida é sofrimento. Isso é bobagem. Sinceramente, é bom estar vivo. É
emocionante.
(O ancião dirige-se à estrada, seguido pelo
viajante, para juntar-se ao cortejo festivo. Cumprimenta cordialmente o
viajante e une-se aos outros aldeões em festa. O viajante assiste
admirado o cortejo passar e, antes de retirar-se da aldeia, deposita
flores na pedra do túmulo do
viajante morto. A paisagem é indescritivelmente bela... E os moinhos, girando no ritmo da correnteza do rio, expressam o ritmo da vida).
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