sábado, 19 de julho de 2014

texana - Charles Bukowski

ela é do Texas e pesa
47 quilos
e para em frente ao
espelho penteando oceanos
de cabelos ruivos
que descem ao longo de todas
suas costas até a bunda.
o cabelo é magico e lança
faíscas quando eu me deito na cama
e a vejo penteá-los
ela parece uma criatura
saída de um filme mas está
aqui de fato, fazemos amor
pelo menos uma vez por dia e
ela consegue me fazer rir
sempre que deseja.
as mulheres do Texas são sempre
saudáveis, e além disso ela
limpa meu refrigerador, minha pia
o banheiro, e faz comida e
me serve alimentos saudáveis
e lava pratos também.


 "Hank", ela me disse,
segurando uma lata de suco de
uva, "este é o melhor de todos".
 dizia na lata: suco natural de uva
ROSA do Texas.

ela se parece com a Katherine Hepburn
na época
do ensino médio, e vejo esses
47 quilos
penteando um metro
 de cabelo ruivo
diante do espelho
e a sinto dentro de meus olhos,
e os dedos e as pernas e barriga
a sentem, assim como
 aquela outra parte,
e toda Los Angeles se desfaz
e chora de contentamento,
as paredes das alcovas tremem -
 o oceano invade tudo e ela se vira
e me diz, "maldito cabelo!"
e eu digo
"sim".

 Poema do Livro - O amor é uma cão dos diabos

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

olá, como você está?

esse medo de ser o que eles são:
mortos.

pelo menos eles não estão na rua, eles
têm o cuidado de ficar dentro de casa, aqueles
malucos que se sentam sozinhos na frente de suas tvs,
suas vidas cheias de enlatados, riso mutilado.

seu bairro ideal
de carros estacionados
de pequenos gramados
de pequenas casas
as pequenas portas que abrem e fecham
quando seus parentes os visitam
durante as férias
as portas se fechando
atrás do moribundo que morre tão devagar
atrás do morto que ainda está vivo
em seu tranquilo bairro de classe média
de ruas sinuosas
de agonia
de confusão
de horror
de medo
de ignorância.

um cão parado atrás de uma cerca.

um homem silencioso na janela.

Bukowski

Esse é um dos meus favoritos...

Link para o original Bukowski Poemas

domingo, 21 de outubro de 2012

Pronto pra morrer (o poder de uma mentira dita mil vezes) - Jair Naves


No fim da Ladeira, entre vielas tortuosas - Jair Naves

No fim da ladeira, entre vielas tortuosas


Vem até mim um senhor de fala lenta
Diz que bebendo assim eu nem chego aos quarenta
Teima que sabe bem o que deixa um homem no estado em que eu estou
E me alerta que a auto-piedade é a seqüela mais comum do amor
Eu nem ouso discordar
Esse esteve em meu lugar
Então eu desabafo, peço conselhos
Ganho a simpatia dos outros bêbados
Fico elaborando teorias
Tentando esgotar o assunto e seguir em frente a minha rotina
Eu só queria poder
Me redimir com você
Acho que eu te deixei assustada,
Eu agi da forma mais errada
Aquele triste homem intimidado
Agora luta pra se manter afastado
E não te incomodar
Me diz quando parar
(onde é que eu vou parar?)
No fim da ladeira, entre vielas tortuosas,
Há uma vila de casinhas silenciosas
Numa manhã fria, eu saí de uma delas
Convencido de que ali eu havia achado a pessoa certa
Agora dói passar perto daquele lugar
Acho que eu te deixei assustada,
Eu falei alguma coisa errada
Um nervosismo incontrolável
Agora eu luto pra me manter afastado
E não te incomodar
Me diz quando parar
(onde é que eu vou parar?)
Acontece que eu ainda enxergo em ti
Tudo de que eu mais me orgulho em mim
Como um pássaro ruidoso ao ver a luz do amanhecer
Eu não pude me conter
Me desculpa se eu te deixei assustada,
Se eu disse alguma coisa muito errada
Mas eu nunca fui de pecar pela omissão
Ou de ignorar o meu coração
Não vá se afastar.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Vós crédulos mortais, alucinados - Bocage

 LXV

Vós crédulos mortais, alucinados
De sonhos, de quimeras, de aparências,
Colheis por uso erradas conseqüencias
Dos acontecimentos desastrados:

Se à perdição correis precipitados
Por cegas, por fogosas impaciências,
Indo cair, gritais que são violências
D(e) inexoráveis céus, de negros fados:

Se um celeste poder, tirano e duro,
Às vezes extorquisse as liberdades,
Que prestava, ó Razão, teu lume puro?

Não forçam corações as divindades;
Fado amigo não há, nem fado escuro:
Fados são as paixões, são as vontades.

domingo, 25 de dezembro de 2011

Sonhos - Akira Kurosawa

Este dialogo abaixo é reprodução de um capitulo do filme Sonhos de Akira Kurosawa, copiei do site Eu-Lirico. Abaixo tem o link para o video deste trecho do filme no You Tube, testei o link mas pode ser excluído por ser propriedade da Warner Bros. O capitulo começa com a chegada de um viajante em uma pequena aldeia,


Viajante – Qual o nome deste povoado?
Ancião – Não tem. Só chamamos de “O Povoado”. Alguns chamam de Povoado do Moinho.
Viajante – Todos os habitantes moram aqui?
Ancião – Não. Moram em outros lugares.
Viajante – Não há eletricidade aqui?
Ancião – Não precisamos. As pessoas acostumam-se ao conforto. Acham que o conforto é melhor. Rejeitam o que é realmente bom.
Viajante – Mas, e as luzes?
Ancião – Temos velas e óleo de linhaça.
Viajante – Mas a noite é tão escura.
Ancião – É. Assim é a noite. Por que a noite deveria ser clara como o dia? Eu não ia querer noites claras, que não deixassem ver estrelas.
Viajante – O senhor tem arrozais. Mas não tem tratores para cultivá-los?
Ancião – Não precisamos. Temos vacas, temos cavalos.
Viajante – O que usa como combustível?
Ancião – Lenha, na maioria das vezes. Não achamos direito cortar árvores, e muitos galhos caem sozinhos. Cortamos e usamos como lenha. E para carvão de madeira, poucas árvores aquecem tanto quanto uma floresta. Também estrume de vaca dá bom combustível. Gostamos de viver respeitando a natureza. As pessoas, hoje, esqueceram que são apenas parte da natureza. Mas destroem a natureza da qual dependem nossas vidas. Elas sempre acham que podem fazer melhor. Especialmente os cientistas. Podem ser inteligentes, mas não compreendem o verdadeiro significado da natureza. Só inventam coisas que tornam as pessoas infelizes. Mas têm tanto orgulho das invenções deles. Pior é que muita gente também se orgulha. Encaram-nas como milagres. Idolatram-nas. Não percebem, mas estão perdendo a natureza. E, como conseqüência, vão morrer. As coisas mais importantes para o ser humano são ar puro e água limpa, as árvores e grama que os produzem. Tudo está sendo poluído, e perdido para sempre. Ar sujo, água suja, sujando os corações dos homens.
Viajante – Vindo para cá, vi algumas crianças colocando flores em uma pedra ao lado da ponte. Por quê?
Ancião – Ah, isso. Meu pai me contou uma vez. Há muito tempo, acharam um viajante morto, perto da ponte. Os aldeões ficaram com pena e o enterraram lá. Colocaram uma pedra na tumba dele e puseram flores. Tornou-se um costume colocar flores lá. Não só as crianças. Todos os aldeões colocam flores quando passam, embora a maioria não saiba por quê.
Viajante – Há um festival hoje? (ouvindo uma festividade aproximando-se).
Ancião – Não, é um funeral. Acha estranho? Um funeral é sempre agradável. Viver bem, trabalhar bem e morrer com agradecimentos é louvável. Não temos templos nem sacerdotes aqui. Assim, os próprios aldeões levam os mortos até o cemitério da colina. Mas não gostamos quando jovens e crianças morrem. É difícil comemorar tal perda. Mas, felizmente, as pessoas deste povoado levam uma vida natural. Então, morrem de acordo com a idade. A anciã que vai ser enterrada viveu gloriosamente os 99 anos. Agora, vou unir-me ao cortejo. Com licença. Na verdade, ela foi o meu primeiro amor. Mas ela partiu meu coração e me trocou por outro. Ha! Ha! Ha! Ha! Ha!
Viajante – A propósito, quantos anos tem?
Ancião – Eu? Cem... mais três. Boa idade para parar de viver. Uns dizem que a vida é sofrimento. Isso é bobagem. Sinceramente, é bom estar vivo. É emocionante.

(O ancião dirige-se à estrada, seguido pelo viajante, para juntar-se ao cortejo festivo. Cumprimenta cordialmente o viajante e une-se aos outros aldeões em festa. O viajante assiste admirado o cortejo passar e, antes de retirar-se da aldeia, deposita flores na pedra do túmulo do viajante morto. A paisagem é indescritivelmente bela... E os moinhos, girando no ritmo da correnteza do rio, expressam o ritmo da vida).

Video

Citação - Willians Burroughs

Desça a rua, qualquer rua, gravando e fotografando tudo que você ouvir e ver. Vá então para casa e escreva a respeito de suas observações, sentimentos, associações e pensamentos. Depois compare suas anotações com as evidências fornecidas pelas fotos e fitas. Descobrirás que sua mente registrou apenas uma fração de sua vivência. O que você deixou de fora talvez seja o que você precise descobrir. A verdade pode aparecer apenas uma vez. Ela pode não ser repetida